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domingo, 1 de janeiro de 2012

Submundo - Subvida


   Havia um andarilho que vestia calças sujas e remendadas, camisa rasgada, barba por fazer, cabelos emaranhados e os pés descalços. O único objeto que possuía era uma mala mais surrada que as próprias vestes.
   Ele tinha seus momentos de reflexão quando dizia que se possuísse recursos para uma vida digna, não seria como os milionários que querem sempre mais. Estaria satisfeito com o mínimo para viver.
   Os dias se passavam e ele insistia na idéia. Um dia a fortuna aproximou-se dele e fez uma proposta: colocaria na mala velha quantas moedas de ouro ela suportasse. Existia um porém: aquilo que caísse no chão seria transformado em pó.
   Imediatamente ele abriu a mala jogando fora um pedaço de pão e um jornal velho que forrava os bancos para dormir. Seus olhos estavam maravilhados. Segurava com desespero o fundo da mala para que não se soltasse e para que suportasse cada vez mais e mais moedas.
   Em um dado momento, a fortuna interrompeu o fluxo das moedas alertando que a mala não suportaria mais peso, mas o andarilho retrucou que não, que colocasse mais moedas, pois ele suportaria com os próprios braços o que a mala não agüentasse. Foi feito conforme sua vontade. A mala rompeu-se transformando em pó todas as moedas de ouro.

   Quando iniciamos nossa vida física para reajustarmos a nossa consciência com a paz somos parecidos com o andarilho, fazemos inúmeras promessas de sermos melhores, de acertarmos nossos erros passados. Mas quando aqui chegamos nos maravilhamos com os bens e prazeres materiais, nos abraçamos à mala da existência física que vai sendo corroída pelo tempo, na tentativa de aproveitar cada segundo na Terra, estocamos valores que não nos acompanharão do outro lado da vida.

   Passamos a viver num mundo em que os valores morais são colocados em segundo plano pela necessidade exagerada de sucesso e bens materiais, onde o ter é mais importante que o ser, onde o dar vem depois do receber e quando vem, elegemos, primeiramente o eu ao invés do nós, perdemos a noção de solidariedade e esquecemos a máxima que Jesus nos ensinou do “amarmo-nos uns aos outros”.

   Vamos, por nosso próprio livre-arbítrio, ignorando o nosso semelhante e nos tornamos algumas vezes capazes de atos desleais e inferiores com o nosso próximo para conquistar os gozos materiais. Vivemos num submundo, uma subvida!

   Na questão 716 do LE nos ensinam os espíritos amigos que: “A natureza traçou o limite de nossas necessidades em nossa organização, mas o homem é insaciável e os vícios alteraram sua constituição e ele criou para si necessidades que não são reais”.

   No livro Caminho, verdade e vida, Emmanuel nos aconselha: “Se teus desejos repousam nas aquisições factícias, relativamente a situações passageiras ou a patrimônios fadados ao apodrecimento, renova, enquanto é tempo, a visão espiritual, porque de nada vale ganhar o mundo que te não pertence se perderes a ti mesmo, indefinidamente, para a vida imortal.”

   Não estamos aqui condenando o uso dos bens materiais conquistados com o esforço e o suor do trabalho digno, mas o abuso desses bens materiais, a preocupação excessiva com mais e mais conquistas deixando de lado valores, princípios essenciais, necessários a nossa evolução como espíritos.

    Algumas vezes chegamos a um determinado patamar de nossas vidas em que temos um emprego bom, uma salário digno e capaz de manter com certo conforto nossa família, mas ainda não estamos satisfeitos, queremos mais, queremos o carro do ano, a moto do ano, etc. E a sociedade consumista ao nosso redor também nos cobra que tenhamos mais.

   Precisamos entender que tudo o que possuímos nos é emprestado por Deus para que realizemos a nossa evolução, sejam os bens materiais que deixaremos ao retornar à Pátria Espiritual ou mesmo antes disso se não nos forem mais necessários; sejam as pessoas que conosco compartilham a existência, elas também não nos pertecem e um dia seguirão seus caminhos na evolução junto ou não a nós, o importante é estarmos unidos através dos elos estabelecidos pelo amor, o amor que liberta, que permite ao outro seguir o seu caminho; seja mesmo o nosso corpo físico que deixaremos no túmulo, e de tudo isso prestaremos conta do bom ou mau uso que fizemos.

   Libertemo-nos do apego excessivo aos bens e aos nossos entes queridos, abramos espaço ao cumprimento de nossos deveres e compromissos. A eterna luta por mais e mais conquistas nos aprisiona.

     Chegamos ao ponto de nos deixarmos aprisionar pelos bens materiais que nos tomam tempo essencial, o telefone celular que a um simples toque interrompemos a atividade que estávamos executando para atendê-lo, muitas vezes atividades de harmonia e paz como uma leitura ou o diálogo com a família; nos deixamos aprisionar pelo computador, pela internet que nos toma horas intermináveis que poderíamos utilizar no diálogo carinhoso e instrutivo com os filhos, com o cônjuge, etc.

   Quantas oportunidades de trabalho, de ajuda ao próximo perdemos, dentro mesmo da nossa casa, quando extremamente voltados às conquistas materiais não temos tempo para o diálogo fraterno em casa, para a educação dos nossos filhos, para o carinho e o afeto.

   Nosso maior tesouro não é material, é sutil. Família, amizade, amor, tempo, saúde, trabalho, conhecimento, moral.

   Jacob Melo no livro Pense sobre isso nos diz: “O maior tesouro é aquele que não fica preso no peito, na mente ou em qualquer estrutura egoística, mas o que vai aberto em benefício de todos."

   Como nos ensinou Jesus no Cap. XXV item 6 do ESE não acumulemos valores que as traças roem e os ladrões roubam, mas tesouros no céu, pois onde está o nosso tesouro aí estará o nosso coração.Valores como a paciência, a piedade, a compaixão, a misericórdia, a solidariedade, o perdão, resumidamente, a caridade e amor, elevam o nosso espírito e são somente estes os necessários à nossa evolução.

   Aproveitemos esse novo ano que se inicia e não percamos mais tempo, façamos um esforço sincero, a procura do melhor que Deus colocou dentro de cada um de nós, exercitemos as verdadeiras virtudes, procurando ser. Mas o que significa ser? Quando visitamos alguém necessitado, somos; quando utilizamos o diálogo e a compreensão dentro de casa, somos; quando praticamos o perdão, a compreensão, a tolerância, somos, somos filhos de Deus!  Procuremos viver nesse mundo com a consciência de que não somos desse mundo, mas de um mundo onde os verdadeiros valores são os espirituais.

   Encerramos essa conversa com um pequeno diálogo ocorrido entre um certo turista quando encontrou-se com um famoso mestre egípcio na Cidade do Cairo, surpreso ao ver que o ancião morava em um quarto singelo onde as únicas mobílias eram uma mesa, uma cama de palha e um banco.
   Perguntou-lhe o turista: - Onde estão seus móveis?
   O sábio respondeu com outra pergunta: - Onde estão os seus?
   O turista respondeu-lhe: - Eu estou aqui de passagem.
   E com toda sua sapiência o sábio concluiu: - Eu também!

Um comentário:

Cláudio disse...

"Deus não condena os gozos terrenos, condena sim aqueles que vão em detrimento das coisas da alma" (LE). Um abraço! Cláudio