Exposição baseada no capítulo "Psicologia da Caridade" do Livro da Esperança psicografia de Chico Xavier, pelo espírito Emmanuel.
Neste
capítulo do Livro da Esperança, Emmanuel faz uma análise da parábola do bom
samaritano que está lá no ESSE cap. XV item 2 e para acompanharmos esta análise
seria interessante relembrarmos a parábola contada por Jesus:
Um
homem, que descia de Jerusalém para Jericó, caiu em poder de ladrões, que o
despojaram, cobriram de ferimentos e se foram, deixando-o semimorto. -
Aconteceu em seguida que um sacerdote, descendo pelo mesmo caminho, o viu e
passou adiante. -Um levita, que também veio àquele lugar, tendo-o observado,
passou igualmente adiante. - Mas, um samaritano que viajava, chegando ao lugar
onde jazia aquele homem e tendo-o visto, foi tocado de compaixão. -
Aproximou-se dele, deitou-lhe óleo e vinho nas feridas e as pensou; depois,
pondo-o no seu cavalo, levou-o a uma hospedaria e cuidou dele. - No dia
seguinte tirou dois denários e os deu ao hospedeiro, dizendo: Trata muito bem
deste homem e tudo o que despenderes a mais, eu te pagarei quando regressar.
Acabamos
de passar por uma época de Natal, quando nossos corações ficam mais sensíveis a
dor do próximo, nos preocupamos mais com a dor do outro, com campanhas para que
todos passem um natal sem fome, sem miséria... Mas será que os necessitados só
precisam de nosso auxílio nessa época. Não sentirão eles fome e frio o ano
inteiro? Não terão necessidade da palavra amiga, do incentivo, da nossa atenção
o ano inteiro?
Quando
ocorrem tragédias que nos chocam, como terremotos, enchentes, tsunamis, ficamos
todos comovidos, e procuramos de certa forma auxiliar aqueles que estão
passando por momentos difíceis, a nossa solidariedade desperta. Mas serão
necessárias as tragédias para que a nossa solidariedade desperte? Não
enxergamos o necessitado diariamente ao nosso lado? No sinal, no hospital, no
asilo, no amigo enfermo, no idoso carente, na esposa ou esposo estressados? Não
necessitam todos estes de nosso auxilio diariamente?
Mas
nós continuamos agindo como o Levita e o Sacerdote, passamos ao lado daquele
que sofre e fingimos não enxergar, para não nos perturbarmos, para mantermos a
nossa paz, fingimos não ver o enfermo necessitado da nossa visita, o filho
perturbado no lar necessitando do nosso conselho, até que a situação se torne
insustentável...
O
Samaritano, que não era muito bem visto na época, pois não seguia os costumes
religiosos vigentes, auxiliou sem perguntar a quem e sem fazer alarde. E nós?
Como temos agido quando auxiliamos, será que não gostamos de aparecer naquela
foto para mostrar que estamos fazendo o bem? Será que o estamos fazendo
desinteressadamente ou buscamos o aplauso alheio para as nossas boas ações? Não
estaremos barganhando com a nossa caridade?
O
Samaritano nada perguntou ao homem que auxiliou, não quis saber por que ele
encontrava-se naquela situação, nem quais eram seus antecedentes, suas ações,
seus credos, ou o que seja, apenas estendeu a mão e auxiliou.
E
nós o que costumamos fazer aos caídos que levantamos, normalmente apontamos
seus erros e até utilizamos aquela velha frase: “eu avisei, eu sabia que isso
iria acontecer”. Auxiliamos sim, mas humilhamos aquele a quem estendemos a mão,
como se nunca errássemos, como se muitas vezes não fossemos também nós os
necessitados de uma mão amiga a nos levantar no caminho.
No
livro Saúde Mental nos aconselha o Dr. Inácio Ferreira: “Amenizemos o peso do fardo sobre os ombros alheios sem a menor censura
à invigilância de quem o transporta, porque, também para nós, chegará o momento
em que, mesmo bem-intencionada, a palavra de recriminação de quem auxilia será
como receber um tapa no rosto.”
O
Samaritano não deu apenas o dinheiro ao necessitado, ele deu também de si, de
seu cuidado, de seu carinho, tratando pessoalmente de seus machucados. Não
apenas a caridade material se faz necessária em nossas vidas. Ela é importante
sim, aplacar a fome, a necessidade do outro é fundamental, mas esse prato de
comida pode vir acompanhado de um sorriso, de uma conversa amiga. A roupa que
doamos, que não nos interessa mais pode vir com o cuidado da limpeza, do pregar
aquele botão ou fazer aquele remendo, para que o outro o receba em condições.
E
muitas vezes pode ser que o necessitado ao nosso redor o seja muito mais de
amor, de uma palavra, de um conselho e até de uma prece. É a caridade moral,
que nada nos custa, a não ser nossa boa vontade, é quando damos de nós mesmos.
Hammed
no Livro Prazeres da Alma nos diz que “Um
olhar atencioso e um abraço carinhoso curam mais do que inúmeras caixas de
remédio.”
Mas
para praticar essa caridade se faz necessário que estejamos atentos, atentos
aqueles que estão ao nosso redor, porque muitas vezes na correria do dia-a-dia
não enxergamos as chagas morais que o companheiro traz em seu coração, as dores
que traz na alma. E que poderíamos auxiliar se deixássemos de olhar 24 horas
por dia para o nosso próprio umbigo e olhássemos para o lado por alguns
minutos.
Quando
voltarmos para o plano espiritual e revermos nossas vidas, vamos ficar
estarrecidos de quantas vezes a dor do semelhante nos solicitou a presença de
maneira discreta, mas não percebemos...
O
Samaritano auxiliou e passou, não perguntou quem era o seu próximo, não
esperou-lhe retribuição nem gratidão. Não era necessário. A verdadeira caridade
auxilia e segue. Sem se iludir sobre si mesmo, acreditando-se a melhor criatura
da terra, consciente de que somos todos necessitados e imperfeitos e que aqui
estamos para acudirmo-nos uns aos outros. Para fazermos pelos outros aquilo que
quereríamos que os outros fizessem por nós, tal como está lá no ESSE cap. XI
item 4.
Para
encerrarmos trouxemos uma pequena história do Livro Atravessando a Rua de Richard Sominetti que nos conta assim:
Argemiro
deixou o centro ao final da reunião vespertina de domingo. Era um dos
expositores, especializado em temas evangélicos, exaltando, com frequência, os
valores da fraternidade e do trabalho em benefício do próximo.
De
retorno ao se lar, em edifício de apartamentos, veio-lhe a mente a lembrança de
um vizinho, rapaz solitário e introvertido que frequentava, eventualmente, as
reuniões de assistência. Precisava de ajuda. Não estava bem emocionalmente.
Desajustado, certamente sofria a influência de obsessores desencarnados.
Poderia visitá-lo. Olhou o relógio: dezesseis horas. Muito tarde! Estava
cansado e havia um filme interessante na televisão...
Entrando no prédio, passou diante do
apartamento do rapaz. A porta estava entreaberta. E se batesse, só para um alô?
Argemiro relutava. Queria repousar. Além do mais, sairia à noite. O papo
ligeiro acabaria estendendo-se, atravessando seu passeio. Ficaria para outro
dia...
Entrou em seu próprio apartamento.
Ligou a televisão, retirou um refrigerante da geladeira e, refestelando-se no
sofá, suspirou feliz... Ah! As delícias de um fim de domingo tranquilo, sem
nenhuma preocupação!...
Entretanto, o vizinho não lhe saia
da cabeça: bem que poderia procurá-lo, fazendo-o sentir que havia alguém que se
interessava por seu bem-estar. O moço precisava de amigos...
“Não e não!” – afirmou categórico
para si mesmo – “Há algum obsessor querendo perturbar meu repouso! Mas não
conseguirá!”
E mergulhou no programa de
televisão, sorvendo, preguiçoso, a bebida. O sono chegou de mansinho.
Reclinou-se e dormiu. Teve sonhos confusos, com cenas de ambulância e viaturas
de policiais trafegando ao som de estridentes sirenes. Despertou, inquieto, às
dezenove horas. Banhou-se, tomou leve refeição e saiu.
À porta do prédio percebeu um
ajuntamento de pessoas. Viatura policial e ambulância estavam de saída. Levavam
um cadáver. Seu vizinho suicidara-se exatamente naquele espaço de tempo em que
Argemiro, postado diante da televisão, resistia ao impulso de visitá-lo.
A intenção do suicídio dispara
alarmes no plano espiritual, mobilizando familiares, amigos e orientadores
espirituais que, com recursos ao seu alcance, tentam demover seus tutelados do
gesto desesperado...
A grande dificuldade dos benfeitores
do além é que dependem de instrumentos de boa vontade entre os homens. E estes
nem sempre estão dispostos a atender seus apelos. Há a televisão, os
compromissos sociais, os lazeres intransferíveis, a insuperável vocação para o
repouso.